Duzentas e setenta pessoas que viviam internadas em instituições psiquiátricas, sofrendo com abandono e exclusão social, moram hoje em residências com apoio de cuidadores, em um ambiente que promove e estimula o convívio social.
O Serviço de Residência Terapêutica (SRT) é oferecido pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio da Secretaria Municipal de Saúde. Atualmente são 33 residências que funcionam como verdadeiras moradias para portadores de sofrimento mental, que foram abandonados pelas famílias e pela sociedade em uma instituição psiquiátrica. Estas casas possibilitam aos cidadãos, antes excluídos do convívio social, o direito de conviver em sociedade e terem os demais direitos respeitados.
Cada SRT possui em média de nove a 11 moradores. Eles são acompanhados pelo supervisor da casa e por cuidadores 24 horas por dia. Os que têm maior autonomia auxiliam, inclusive, nas tarefas diárias da casa e são incentivados para que se apropriem cada vez mais da sua residência.
É o caso de Antônio Carlos Albergaria, de 77 anos. Dono de uma personalidade cativante, ele teve um passado solitário, tendo sido internado pela primeira vez aos 18 anos, com esquizofrenia e debilidade mental. Passou quase a vida inteira privado de fazer o que queria. Saía apenas aos domingos para visitar a família.
Hoje, a vida de Antônio é bem diferente. Desde 2008, ele mora em uma residência terapêutica no bairro Santa Amélia e conquistou a liberdade de fazer o que gosta. “Tenho muitos amigos. Antes de morar em residência, eu quase não fazia nada. Só desenhava, dormia e ouvia discos. Hoje, eu saio para rua. Vou ao supermercado, pago contas, pego ônibus e saio, depois volto para casa. Hoje posso dizer que eu sou cidadão de verdade. Sou feliz”, conta ele, sorrindo.
Para cada paciente, um projeto terapêutico. Dependendo da avaliação clínica, o morador é atendido pelo centro de saúde de referência mais próximo ou encaminhado ao Centro de Referência em Saúde Mental - CERSAM.
A Residência Terapêutica Heliópolis, situada no bairro Planalto, é um lar muito especial. A maioria dos seus oito moradores é independente, tem autonomia e colabora nas tarefas diárias. Elisabeth Rodrigues Ferreira, 54, é uma das moradoras mais participativas. Ela exibe um sorriso no rosto quando fala sobre a sua casa e seus amigos. “Gosto de ajudar a preparar e servir as refeições, fazer compras e adoro sair para dançar”, conta.
A convivência com os portadores de sofrimento mental reflete em aprendizado tanto para quem cuida como para quem recebe os cuidados. Segundo a supervisora Isabela Cristina Leonardo, os moradores são estimulados para conquistar cada vez mais autonomia e participar das rotinas do dia a dia de uma casa. “Eles saem para comprar coisas que gostam e têm ótima relação com a vizinhança, o que é muito importante, pois antes viviam isolados, sem esse convívio com outro. Dentro de casa também cooperam muito, lavando a louça, arrumando o quarto, fazendo café. Pequenas tarefas para a gente, mas uma grande conquista para eles”, relata, animada.
A criação das residências terapêuticas segue determinação da Lei Federal 10.216, das portarias 106/01 e 3088/12 do Ministério da Saúde, e ainda as diretrizes da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial. De forma humanizada, nessas moradias eles recebem apoio de profissionais de saúde mental para acompanhamento de sua saúde e recebem o direito de viver fora de instituições de saúde mental, como os antigos hospícios.